No volume anterior, Brian K. Vaughan deixou-nos em sobressalto, quando orquestrou toda uma série de reviravoltas que envolveram directamente a vida dos protagonistas. Marko foi separado da sua família, o Príncipe Robot IV teve a sua mulher assassinada e o filho raptado enquanto, por fim, o mercenário conhecido por A Vontade – cujas acções têm cada vez mais provado que até um assassino pode ser nobre – foi deixado às portas da morte. A curiosidade para assistirmos ao desenrolar de todas estas acções era muita e, finalmente, já pôde ser saciada.
Claro que, muitas vezes, as tragédias pessoais das personagens se tornam as delícias dos leitores, o que acaba por acontecer quando vemos Marko reunido com o Príncipe Robot IV, o pequeno e amigável Ghüs e a trágica figura de Yuma. A dinâmica entre estes quatro funcionou terrivelmente bem, algo que está relacionado com o facto de termos aqui reunido um leque de personagens que oscila entre as mais perigosas e carinhosas da galáxia, forçadas a unirem-se por um bem maior: a protecção dos nossos filhos. Enquanto o Príncipe Robot IV se mostra mais implacável do que nunca (o que é dizer qualquer coisa), pronto a sacrificar tudo e todos, assistimos também ao encontro de Marko com o seu lado mais negro. Esta personagem sempre sobressaiu pela sua dedicação ao pacifismo, um ideal que se tornou matéria quando Hazel nasceu, numa clara representação física da paz nesta história. Porém, sempre foi claro que a sua luta contra a violência era consciente contra a sua própria natureza, o que na realidade só lhe acrescenta valor. Esta batalha que Marko trava todos os dias torna-se inglória quando é arrancado da sua família e, relembrando as palavras da sua própria filha – a narradora -, os seus pais sempre funcionaram melhor juntos do que separados. Ainda assim e regressando ao prazer da leitura, não deixa de ser entusiasmante para nós, leitores, conhecer a verdadeira essência guerreira de Marko, quiçá a personagem mais aterradoras de Saga (G. Floy, 2016).
No outro lado da Galáxia Alana, Hazel e Klara mantêm-se prisioneiras de Dengo, o rebelde que raptou o mais recente herdeiro do trono Robot, em busca de vingança pela morte do seu próprio filho. Se olharmos com atenção para Dengo quase podemos ver nele uma possível versão futura de Marko, no sentido em que foi a perda de um filho que o levou a seguir um caminho tão negro e cheio de ódio – porque todos carregamos dentro de nós a capacidade de sermos o melhor e o pior na vida. Dengo poderia ser um verdadeiro lutador pela paz neste Universo mas, infelizmente, a vingança corrompeu o seu coração – e, quando abdicamos dos nossos valores para perseguir cruzadas destas, podemos acabar corrompidos ou muito arrependidos.
Por fim encontramos Gwendolyn, Sophie e A Marca, numa odisseia em busca de sémen de Dragão, supostamente um elixir da vida para os ferimentos do A Vontade. É uma história relativamente banal, cujo único propósito é fazer esta narrativa voltar ao status quo, tentando dar-lhe mais significado com algumas manobras perigosas e permanentes algo que, ao menos, não se sentiu nas descritas anteriormente.
De resto é de continuar a salientar a consistência na qualidade de “Saga”. Brian K. Vaughan, número atrás de número, continua a deixar-nos envolvidos nesta trama familiar onde todos os géneros do fantástico e da ficção-científica se encontram num dos maiores casamentos actuais na ficção. Fiona Staples, sempre segura, continua a demonstrar porque foi a escolha certa no retrato desta aventura. Staples tornou-se numa das desenhadoras mais conhecidas da actualidade graças a esta série, um triunfo que nunca se poderia dever apenas à qualidade do seu argumentista.
Sem Comentários